domingo, 10 de março de 2013

O INFERNO DE UM ANJO - SEGUNDA PARTE - CAPÍTULO 28 - COLABORAÇÃO PAULO SENA

O INFERNO

DE UM ANJO

Romance-folhetim



Título original:
L’enfer d’un Ange




Henriette de Tremière/o inferno de um anjo

(Texto integral) digitalizado
e revisado por Paulo Sena

Rev. G.H.
BIBLIOTECA GRANDE HOTEL


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Segunda Parte - Capítulo XXVIII
AMIZADE LEAL

Após sua chegada a Londres, Maria "Flor de Amor" e Clara Villiers hospedaram-se na "Rose de France", modesta hospedaria do bairro de Lambeth, um dos mais pobres da grande capital inglesa.
A única preocupação das duas jovens era conseguir trabalho, um emprego que lhes permitisse ganhar o necessário para seu sustento.
Clara falava com bastante fluência a língua inglesa, enquanto que Maria "Flor de Amor" tinha apenas rudimentares noções desse idioma.
A leitura dos anúncios nos jornais era a primeira coisa que as duas jovens faziam pela manhã bem cedo. Clara não queria empregar-se enquanto "Maria Flor de Amor" não tivesse achado um trabalho que prestasse para ela.
Mas a dificuldade com Maria "Flor de Amor" consistia em seu quase total desconhecimento do idioma inglês.
Após diversas tentativas, Maria "Flor de Amor" conseguiu ser admitida num atelier de costura, de uma inglesa que fingia ser francesa, para atrair clientes que davam preferência às modas de Paris. Se alguma freguesa que falasse francês aparecesse por ali, seria Maria "Flor de Amor" quem conversaria com ela.
Nessa época, a jornada de trabalho era de doze extenuantes horas, que Maria "Flor de Amor" tinha que passar com as costas curvadas, costurando a mão, vestidos e até capas de pele. Madame Filomena era uma pessoa exigente, sempre de olhos postos nos que trabalhavam para ela, pronta a repreender quem por um momento apenas deixasse de produzir.
Clara Villiers teve mais sorte para empregar-se. Foi admitida como balconista numa perfumaria, por saber falar tanto a língua inglesa quanto a francesa. Naquela loja, o trabalho era suportável e o dono era pessoa compreensiva, sem o egoísmo sanguessuga de madame Filomena. Clara, sabendo das péssimas condições em que Maria "Flor de Amor" trabalhava, lia com sofreguidão todas as manhãs os anúncios que, oferecendo empregos, publicavam os grandes jornais de Londres.
Enquanto Maria "Flor de Amor" padecia durante doze horas diárias as constantes exigências da desapiedada modista a cujo serviço estava, longe da Inglaterra, precisamente em Nova Orleans, dois homens a procuravam sem parar.
Um deles era o barão Luís Paulo de Rastignac, aquele que nunca deixara de amá-la, o outro, o conde Fernando de Chanteloup, seu pai.
Ela nascera daquela paixão que ele dedicara a Marta Aubert, de quem de uma forma tão infame fora separado pela perversa marquesa Renata.
Mas, todas as buscas e investigações que o conde e o barão realizavam de nada serviam, não conseguiam descobrir a mais leve pista que os permitisse encontrar a desaparecida Maria "Flor de Amor".
Passavam-se os dias e tanto Fernando como Luís Paulo se desesperavam, porque nem eles nem as agências de detetives a que recorreram obtinham o menor resultado. Ninguém sabia nada a respeito de Maria "Flor de Amor".
Desde logo, eles não recorreram a Ubaldo Duroi. Agora estavam persuadidos de que o maquiavélico detetive era um sujeito imoral, um intrigante - como o próprio policial não tardou em confirmar pouco depois.
Nesse meio tempo o conde Fernando recebeu a notícia de que seu tio, o conde Oswald Robertson, estava doente gravemente, em Londres e não queria morrer sem dar um último abraço no sobrinho, que era também seu afilhado.
O conde Robertson, viúvo sem filhos, tinha apenas um parente: o conde Fernando Chanteloup. Este não podia deixar de ir ver o nobre e velho aristocrata, que sempre lhe professou grande afeto.
Morava em Londres o conde Robertson num castelo suntuoso, como lhe correspondia por ser ele um dos homens mais ricos da Inglaterra.
Acamado, percebendo que o fim de sua vida estava muito próximo, Lord Robertson não cessava de perguntar aos seus criados:
- Meu afilhado, o conde Fernando, ainda não chegou?
No embarcadouro de Nova Orleans, Luís Paulo e Fernando se despediram. O jovem ficou encarregado de prosseguir as exaustivas investigações para descobrir o paradeiro de Maria "Flor de Amor".
Quando o conde Fernando chegou ao castelo de seu tio, o conde Robertson, achou este ainda com vida. O velho abraçou-o, molhando com lágrimas o rosto de Fernando, que o beijou com emoção filial. Depois, o velho aristocrata falou-lhe a respeito de seu testamento, feito poucos dias antes.
- Você é meu herdeiro universal. Quero que uma parte considerável de minha grande fortuna, mais de cem milhões de libras esterlinas, você a empregue na fundação de creches, onde as mães que têm de trabalhar fora de casa, deixem suas crianças ao cuidado de professoras, babás e enfermeiras. Os bairros pobres de Londres estão precisando muito de creches.
Fernando de Chanteloup prometeu a seu tio que suas últimas vontades seriam cumpridas à risca.
Três dias mais tarde, o conde Robertson agonizava, morrendo nos braços do sobrinho que iria suceder-lhe nos títulos e na posse de uma das maiores fortunas da Inglaterra.
Após os funerais, quando o conde deveria começar a ocupar-se dos múltiplos bens herdados e levar a efeito as obras beneficentes que o conde Robertson queria que fossem criadas como grata lembrança de sua passagem por este mundo, Fernando falou com o mordomo:
- Preciso do auxílio de alguém que, além do inglês, fale também francês perfeitamente. Quero empregar uma secretária que reúna essas duas qualidades. Sei que não é fácil, mas poderá conseguir, sobretudo oferecendo-lhe um ordenado atraente: quinhentas libras esterlinas, por exemplo.
- Quinhentas libras! - repetiu o mordomo, atônito. - Ótimo salário! Quem pegar esse emprego poderá considerar-se uma felizarda.
O anúncio foi publicado nos dois mais importantes jornais londrinos. E foi lido por Clara Villiers.
- Que ótimo emprego para Maria "Flor de Amor" - murmurou generosamente no primeiro instante. Mas logo se lembrou do exíguo que era o inglês da amiga e suspirou acrescentando: - Não seria admitida. Ela não sabe escrever em inglês.
Mas em seguida disse para si mesma: - Quinhentas libras! Ganho apenas setenta como balconista.
E se eu tentasse conseguir para mim esse atraente emprego? Valeu-se de um pretexto para abandonar seu posto na perfumaria durante umas horas e apresentou-se no castelo.
O conde Fernando acolheu-a afavelmente e apenas conversaram uns minutos. Fez uma prova de redação em francês e em inglês e foi admitida.
- Desejo que a senhora - disse-lhe o nobre - permaneça dia e noite no castelo. Assim, além do ordenado, terá casa e alimentação e eu poderei requerer seus serviços a qualquer momento.
Clara concordou e ficou de tomar posse do emprego no dia seguinte.
Aquela noite ela e Maria jantaram juntas. "Flor de Amor" estava emagrecida e muito pálida. As doze horas de trabalho diários sob o olhar implacável de madame Filomena estavam murchando-a. Desaparecera a cor rosada de suas faces por completo e em seus belos olhos apareciam a tristeza de uma alma que perdeu por completo a esperança.
- Garota! - disse Clara, observando Maria "Flor de Amor" - Você está doente?
- Não, mas com a vida que levo naquele atelier infame, não tardarei em estar! - retorquiu Maria "Flor de Amor".
- Isso não vai durar, minha querida. Ainda não lhe contei que consegui um novo emprego. Passei da perfumaria para o castelo do conde Robertson, e sabe com que ordenado? Quinhentas libras mensais!
- Quinhentas libras! - repetiu toda admirada Maria "Flor de Amor" - E qual vai ser o seu trabalho nesse castelo?
- Secretária do conde Robertson, que fala francês fluentemente.
Ele precisava de uma secretária que dominasse os dois idiomas. Apresentei-me a ele e fui aceita. E digo mais: vou fazer com que você seja também admitida naquele castelo. Não demorará em poder mandar para o inferno a rabugenta madame Filomena, minha querida Maria "Flor de Amor".
E Clara não tardou em cumprir a promessa que fizera a sua amiga, continuando assim a ajudarem-se mutuamente. Felizmente, o mordomo estava precisando de uma costureira que soubesse consertar as librés do numeroso pessoal que servia ao castelo. E assim, pois, aquele homem que, além de ser mordomo, chefiava os demais empregados, admitiu sem dificuldades à Maria "Flor de Amor", claro que com um salário bem mais magro que o de Clara. Oitenta libras mensais, com direito a comida e aposento. Deste modo, Maria "Flor de Amor", empregada no castelo, onde tratava de cumprir a risca o seu dever para que o mordomo não a mandasse embora, estava bem perto do homem que tão afanosamente a procurara em Nova Orleans.
E por um capricho do destino, ela desempenhava o mais humilde dos empregos num opulento castelo, que pertencia a seu pai e que por lei de herança, ela deveria herdar!

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