segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

WEBNOVELA - LAÇOS - CAPÍTULO 24 - PRIMEIRA PARTE - AUTORA: JULIANA SOUSA

Capítulo 24 – Mãe.

Gabriele parecia nervosa. Por alguns segundos olhava fixamente o nada, enquanto o telefone ainda permanecia em suas mãos.
— Eu não acredito... Sou de fato uma péssima mãe. Eu tentei ajudar e agora Viviane está sofrendo mais ainda.
As gêmeas que estavam sentadas na sala juntamente com ela logo perceberam que algo não estava normal.
— Gabriele, aconteceu alguma coisa? – perguntou Emanuela preocupada.
Gabriele olhou para Emanuela e com muito esforço conseguiu esboçar um sorriso.
— Sim, tudo normal. Como sempre, é claro, eu não consegui ajudar minha própria filha. Viviane acabou de saber da condição do avô. Ela deve estar desesperada.
Mariana percebeu um profundo sofrimento no olhar de Gabriele. Todo aquele tempo, Mariana pensara que apesar de Viviane tratá-la mal, ela conseguia suportar bem. Mas naquele momento, a garota percebeu que não era bem assim. Era como se todo o tempo ela suportasse os maus tratos de Viviane não porque fosse realmente paciente, mas porque sentia que isso era algum tipo de punição como se fosse culpada por algo e merecesse aquilo. Naquele momento, Mariana percebeu que, pela primeira vez, Gabriele deixava transparecer a real dor que vinha sofrendo.
— Dona Gabriele, digo, Gabriele, já que é tão nova... – disse Mariana – Acho que não entendo muito bem a relação entre sua filha e você e talvez eu nem mesmo tenha o direito de falar nada, mas não acha que está protegendo demais a Viviane? Acho que ela precisa realmente lidar com a dor, digo, mais cedo ou mais tarde ela saberia da condição do Dr. Otávio.
Gabriele olhou para Mariana com ternura.
— Tem razão... Sim, eu tento protegê-la demais. Mas é que eu tento compensar o mal que eu fiz a ela.
— Mal? – perguntou Mariana confusa. – Você é mãe dela. Não é como se pudesse realmente fazer mal à sua própria filha. Só acho que não é justo que a Viviane a trate dessa forma. Desculpe-me dizer isso, mas, às vezes, acho que ela está recebendo algum tipo de punição divina pelo que ela faz.
Emanuela olhou com desaprovação para a irmã.
— Mariana! Tem coisas que não se diz.
— Dessa vez, sinto lhe dizer, Mariana, que você não tem razão. Se existe essa tal punição, então ela é para mim. O fato de ver minha filha sofrendo tanto, apenas me faz sofrer ainda mais.
Emanuela olhou confusa para Gabriele.
— O que está dizendo, D. Gabriele?
— Sim, porque todo esse tempo Viviane tem recebido tanto sofrimento por AL]go que eu cometi. – e olhando para as duas que estavam sentadas uma ao lado da outra. – Já que o fato de Viviane não ser filha do Jorge não ser um segredo, acho que vocês merecem saber isso. Só espero que não me desprezem tanto quanto Viviane me despreza.
As duas permaneceram caladas, enquanto Gabriele continuava.
— Se vocês tivessem me conhecido na época em que engravidei de Viviane, teriam uma impressão diferente de mim do que tem agora. Eu e Jorge nos casamos muito novos, sem saber exatamente o que queríamos. Depois percebemos que não amávamos um ao outro e começamos a nos desentender. Eu propus que nos separássemos. A gravidez foi um acidente, na época, eu saía com outros homens... No começo, eu tentei abortar, tomei remédios, o que não adiantou. Então, marquei um dia em uma clínica para retirar a criança. Foi quando eu ouvi sem querer Jorge falando ao telefone com alguém... Era a mãe de vocês. – disse, olhando com pesar para as meninas que estavam sentadas ao seu lado.
Mariana parecia um pouco chocada.
— Então, a senhora...
— Sim. Eu sabia da sua mãe. A forma como a tratava no telefone, ele parecia tão feliz... Eu achei que não era justo apenas eu sair daquele casamento infeliz. Ele praticamente já estava refazendo a sua vida... No começo, eu senti inveja, mas depois... – disse, tentando tomar coragem. – Depois, eu senti ódio tanto por Jorge quanto pela mãe de vocês, mesmo sem eu conhecê-la.
As duas meninas pareciam chocadas com aquilo.
— Me desculpem por isso... Se eu apenas pudesse voltar no passado...
As meninas continuaram em silêncio esperando que Gabriele terminasse de contar sua história.
— Eu estava com tanto ódio que eu desisti de fazer o aborto. Eu fiz as contas e eu poderia mascarar o nascimento da criança para 7 meses. Então, eu menti para o Jorge dizendo que ele era o pai da criança. Foi quando ele desistiu da separação de vez.
— Então...  Jorge não sabia que a Viviane não era filha dele? – perguntou Mariana.
— No começo, ele não sabia... Mas começou a desconfiar. No dia do acidente que o matou, ele já havia discutido com o pai e, logo depois, por conta disso, eu também discuti com ele. Na minha raiva, para tentar ferir o orgulho dele, eu disse que o filho que eu estava esperando não era dele. E eu ainda disse que tinha feito isso para separá-lo da mulher que ele vinha encontrando... – Gabriele tentava impedir as lágrimas que tentavam sair de seus olhos. – Ele ficou tão chocado na hora. Eu pensei que ele quebraria tudo, ficaria louco. Mas não fez isso... Quando ele olhou para mim, ele não sentia raiva, ódio, nada. Era um olhar vazio como se a vida tivesse saído dele. Eu nunca o tinha visto daquele jeito. Então, ele saiu no carro e o acidente aconteceu.
Mariana e Emanuela, que estava ouvindo, também pareciam um pouco emocionadas.
— Então... Foi nesse dia que ele morreu? – perguntou Mariana com lágrimas nos olhos.
— Sim. Aquele acidente foi minha culpa. Mas o que eu fiz a Viviane foi muito pior.
Emanuela parecia surpresa.
— Pior? – perguntou.
— Assim que ela nasceu, eu a desprezei. Eu não a amamentei, não a pegava no colo. Sempre que eu olhava para ela... – disse, tentando conter mais uma vez as lágrimas. – Eu pensava... “Se você tivesse morrido no lugar dele, tudo estaria melhor, eu não me sentiria tão culpada.” Às vezes, eu também pensava que não fosse por ela, o Jorge ainda estaria vivo. Eu trabalhava até tarde para fugir da presença dela. Muitas vezes, quando eu chegava, ela estava esperando, mesmo sendo tarde. Ela vinha em minha direção, sorrindo, mostrando alguma coisa que ela tinha feito na escola ou em casa, mas eu a afastava com qualquer desculpa. Sempre que eu a via sorrir, eu lembrava daquele olhar do Jorge. A presença de Viviane se tornou um tormento para mim. Até que ela desistiu de esperar. E já nem se importava se eu estava em casa ou não. No começo, eu me senti aliviada, mas conforme o tempo ia passando...
— Você começou a sentir falta. – disse Emanuela.
— Sim. Um dia, no Natal, eu tentei uma aproximação. Comprei uma boneca linda. Mas ela não gostou. Disse que não gostava daquela cor. Foi quando eu olhei para ela e percebi que não sabia nada sobre ela. Não sabia qual era a sua cor preferida, que tipo de comida gostava mais ou como tinha sido o seu primeiro dia na escola. Eu nem sequer lembrava qual foi a primeira palavra que ela tinha falado. – disse, deixando as lágrimas caírem no rosto. – Naquele momento, eu percebi que tinha uma filha. Um ser que cresceu dentro de mim e agora era uma garota linda e cheia de personalidade, mas eu não sabia nada sobre ela. Eu nem sequer fui uma mãe para ela. Só que era tarde demais. Viviane já não me considerava mais parte da família dela. Foi quando eu tentei fugir e fui morar no exterior.  Agora, eu voltei decidida a reconquistar o amor dela, mas acho que isso não é mais possível. Ela me odeia.
Gabriele olhou para as gêmeas e pôde perceber o choque que a história estava produzindo.
— Eu sei... – continuou. – Sei que nunca imaginaram que eu seria capaz de tantas coisas. Agora, vocês sabem por que ela se comporta tão mal comigo.
As duas meninas pareciam tentar digerir toda aquela história.
— Não acredito que Viviane te odeie. – disse Emanuela. – Eu não conheço bem a Viviane, mas já sei algumas coisas sobre ela. – Emanuela ficou com o olhar distante. – Na verdade, ela me lembra alguém de muito tempo... Quando ela grita, quando ela é irritante, ela só está tentando afastar as pessoas, não necessariamente significa que as odeia.
— Eu sei... – disse Gabriele. – Quanto mais ela sofre, mais ela é agressiva. – e deixando as lágrimas cair mais uma vez. – Esse foi o grande mal que eu fiz à minha filha.
As duas meninas se aproximaram de Gabriele.
— A senhora também deve ter sofrido muito, vendo o quanto a Viviane sofreu. – disse Mariana. – Se vocês duas não tiveram boas lembranças no passado, então devem construí-las agora. Mesmo sendo muito nova, eu aprendi que não adianta pensar no passado. Mesmo que você repense nele várias vezes, ele nunca vai ter trazer algo novo.
Gabriele olhou ternamente para a garota.
— Você tem razão. – disse ela, tentando sorrir. – Eu sinto muito por vocês. Logo agora que descobriram que o Dr. Otávio é o seu avô... Todas essas coisas aconteceram.
As gêmeas se entreolharam.
— Gabriele, a verdade é que...
De repente, o telefone tocou, interrompendo o que Emanuela iria falar. Gabriele levantou-se e atendeu ao telefone.
— Alô? Gabriel? O que aconteceu?
As duas meninas olharam para Gabriele e parecia que ela perdera a cor.
— O que foi agora? – perguntou Mariana preocupada.
— Viviane... Viviane sofreu um acidente. – disse, sendo amparada por Mariana, enquanto Emanuela atendia ao telefone e falava com Gabriel.
— Acalme-se Gabriele. – disse Mariana. – Pode não ser tão grave.
— Gabriel disse que eles estão na Emergência do Hospital Alcântara! – disse, desligando o telefone. – Mariana, peça o Rogério para nos levar. Eu acompanho Gabriele até o carro.
— Está bem. – disse, saindo rápido para encontrar o pai.
— O que eu vou fazer? – perguntou Gabriele um pouco desorientada.
Por um momento, Mariana pensou que Gabriele ia desmaiar, mas não o fez.
Emanuela notou que Gabriele tremia de tão nervosa. Percebeu o grande esforço que Gabriele fazia para se controlar.
— A senhora não está em condições de dirigir. – disse séria. – Vamos para o carro, Rogério vai dirigir para nós. – disse.
As duas saíram da mansão em direção ao carro, onde Mariana já esperava com Rogério.
***

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